Ética além de um código

Falar sobre Ética é um assunto inesgotável e felizmente interminável. Sinto que este movimento é crescente e tem se tornado pauta de discussão a cada edição jornalística, não só devido às evidências politicas em cenário nacional, mas também devido as intermináveis discordâncias movidas por crenças religiosas, políticas e econômicas em âmbito internacional. Todas as áreas da sociedade tem se movimentado em torno destes temas. Não só como reação aos acontecimentos, como também por uma crescente necessidade de ordenação. Estamos vivendo a era do conhecimento, onde a busca pela consciência rege todas as nossas ações.

Mas para resolver questões Éticas, não podemos necessariamente estar pautados com base em um Código de Ética, que apesar de nortear condutas previsíveis, certamente não terá amplitude para a diversidade de ocorrências nas relações humanas. Temos que buscar em nossas reflexões, no desenvolvimento contínuo, respostas possíveis para uma situação em uma zona cinzenta ou intempestiva. Olhar os significados, propósitos e intenções que regem os fatos.

Segundo Michael Carroll a capacidade de discernir o certo, o melhor ou a boa ação é parte de nossas vidas diárias. Decisões cotidianas são baseadas em nossa capacidade de escolher a melhor decisão a ser tomada em situações muitas vezes complexas. Não há roteiros para nos guiar na direção da ética correta. Os numerosos códigos de ética e quadros éticos utilizados em várias profissões garantem o comportamento ético automático por parte dos seus membros.

Costumo dizer que é ético aquilo que faz bem para mim e para o outro, servir a um só não é suficiente, temos que estar o tempo todo olhando para dentro e para fora. Um Código de Ética pode servir de arcabouço para um trabalho, uma conversa ou um contexto que regem relações de qualquer tipo. Mesmo quando nos comportamos de forma ética, há momentos em que somos incapazes de articular, por isso fizemos o que fizemos ou fornecemos uma explicação coerente dos processos de tomada de decisão que resultaram em nossa ação. Mesmo quando podemos explicar o que fizemos e conectá-lo com as diretrizes e princípios não há garantias de que vamos ter certeza de que fizemos a coisa certa e, nem sempre, poderemos ficar em paz com a decisão ética ou moral.

Mas, e quando o Código de Ética não é suficiente?

Michael Carroll diz que mais importante do que a ação resultante de um comportamento ético são suas intenções, olhar os valores que regem os comportamentos e discutir necessidades e vontades inerentes. Muitas situações de conflitos se dissolvem quando além dos fatos, entramos nas intenções e sentimentos que estão subjacentes e regendo as ações discutidas, que se dissolvem quando a partir dos sentimentos entramos em contato com as necessidades e vontades subjacentes, e mais do que isso ao chamado humano que rege a consciência, um acordar de humanidade e de justiça consigo e com o próximo. Daí a eficácia do modelo da comunicação não violenta de Marshall Rosenberg, onde ao falar de si e de sua necessidade o ser humano se conecta com o lado humano do interlocutor.

Isso também se chama empatia é a condição de se colocar no lugar do outro perceber o outro em sua real dimensão, onde as intenções habitam, no mais profundo sentimento, e só conseguimos fazer isso com o outro quando buscamos em nós “aquela” realidade, que nos faz entrar em conexão conosco e com o outro em nós. Quando entramos neste espaço interno em nós, criamos um entendimento mágico de abertura para entender o outro em suas mais profundas motivações. Brené Brown diz que só quem já esteve no quarto escuro pode ajudar o outro a encontrar o caminho de saída. Isso complementa e muito, para nós o entendimento que um código por si só não é capaz de nortear uma decisão ética, muitas vezes precisamos entrar em contato com a própria essência para enxergar e reconhecer as necessidades inerentes do outro. Quando um código de ética não é suficiente, podemos dar um próximo passo.

A quem queremos servir?

Servimos a nós e ao próximo, ao nosso cliente, quando temos clareza de suas necessidades. O primeiro passo de uma conduta ética está no acordo de como vamos pautar nossas relação. Criamos um espaço aberto para que acordos possam ser estabelecidos, um espaço de abertura para ambos estabelecermos capacidades, desejos e necessidades. O desenvolvimento desses encontros são possíveis quando existe um espaço de confiança, a certeza que as individualidades presentes tem espaço para suas manifestações. O primeiro passo é olhar o ser humano em sua totalidade, considera-lo capaz e cheio de recursos, tanto em amplitude quanto em profundidade, para que possa conquistar, em plenitude, para que ele atinja o que quer e precisa para o seu desenvolvimento.

Estamos falando de Maturidade Ética!

Para tal, importamos de Michael Carroll o conceito de “Maturidade Ética” que envolve a capacidade reflexiva, racional e emocional para decidir se as ações são certas ou erradas ou boas e melhores; a capacidade de resistência e coragem para implementar essas decisões; ser responsável por decisões éticas feitas (pública ou privada); e a capacidade de aprender e viver com a experiência.

O ponto a ser feito agora é que a maturidade ética não é um “negócio fechado” ou um ponto final definitivo em uma viagem, mas é um processo em constante desenvolvimento. Não é um destino para ser alcançado, mas é o permanente aprendizado contínuo.

Cabe a nós, coaches e em todas profissões, darmos abertura para que nossos clientes ou interlocutores tenham facilidade para dizer o que desejam e precisam para o seu desenvolvimento. Clareza e transparência entre e com todos os interlocutores do processo faz-se necessário.

Ética nas relações de Coach Interno, Coach Externo e Líder Coach:

Muitas vezes questões Éticas surgem quando os acordos iniciais não deixaram claro as condutas possíveis e não possíveis daquela relação.

Coaches e Gestores tem o compromisso com a organização e com os indivíduos para que o desenvolvimento acordado possa acontecer. Muitas vezes as empresas tem suas próprias regras e premissas, às vezes tão importantes de serem honradas quanto o código de ética. Então, em termos práticos, o que precisa ser acordado em cada nova relação, para que capacidades, necessidades, desejos e papéis esperados possam acontecer de forma ética?

Temos que olhar ética em uma visão sob amplos aspectos: Politicas da organização, código de ética, aspectos legais, valores morais pessoais dos envolvidos.

Confidencialidade tem significados diferentes em diferentes papeis e relações. Faz-se premente a oportunidade de desde o início ouvir, discutir e traçar caminhos de ganha-ganha, que uma vez acordados em sua amplitude e limites, possam não comprometer a confidencialidade.

Uma organização oferece coaching para ter mais resultados, importante inicialmente acordar expectativas, definir como isso vai acontecer. Abertura para definir acordos com todos os envolvidos de como o crescimento e desenvolvimento poderá ser manifesto na direção desejada pela organização.

Janet Harvey diz que a ética nos traz a linguagem adequada para os acordos necessários para o crescimento e desenvolvimento dos clientes e das relações. O acordo tem que ser bem detalhado para que tudo fique transparente.

Sim e também não, e não sim ou não! Ética não pode ser um ponto estático. Ética anda em tempo e lugar. Se esconder desta questão ética e não entender os significados, intenções e propósitos de firmar um acordo de confidencialidade.

O que vai ser diferente na organização depois deste processo de coaching?
O que acontece quando a organização – responsável/contratante do coaching, e cliente – pessoa que fará o processo de coaching – criam um caminho possível de coaching entre eles?

Um bom acordo de ética se faz necessário!!

Neste espaço de acordos possíveis, existem capacidades organizacionais disponíveis para que os lideres também possam exercer o coaching como habilidade de sua liderança. O que impede um líder ter esta conversa de coaching, se ele tem como compromisso com a organização de provocar o crescimento e desenvolvimento das pessoas de sua equipe, formar sucessores e liderar um time de alta performance, como solucionar conflitos sem discutir as motivações intrínsecas dos envolvidos?

Qual o papel deste indivíduo como líder nesta organização?

Então, o contrato e o acordo de coaching é o que vai ajudar o que, como, e onde será feito para que esta relação aconteça, dentro desta organização, em transparência e confidencialidade.

Dilemas éticos de venda ou contratação

O que acontece quando o Coach atende vários executivos de uma mesma empresa? ou ate mesmo em uma sessão de coaching quando na interlocução abre-se uma perspectiva de venda para um outro ou novo processo de coaching? Que dilemas surgem na contratação do coaching entre organização/ coach e cliente – quem participa das conversas de contratação onde se fala de quem será “coacheado”? Quem participa das sessões feedback com o gestor? Coach tem conversas privadas com o gestor sobre o cliente? Coach faz relatórios para a empresa?

Problemas resultantes destas questões acontecem e evidenciam a falta de acordos prévios e transparência de contratação, assim como baixa conexão entre propósitos e direcionamentos, ate mesmo na abertura de discussões implícitas se tornarem explicitas a qualquer hora e situação.

Janet Harvey diz que um contrato de coaching e ética abordam o como a relação vai e pode acontecer. Coach e cliente tem uma agenda em conjunto. São parceiros para tratar eventuais duvidas. O como está sempre nas mãos de ambos, para definir sobre o que vai acontecer.

Coach e Julgamentos

Ética também é olhar com transparência e presença para si e para o outro, com curiosidade por tudo que possa estar acontecendo que possa ser do interesse do cliente e em estado de presença passamos a ter curiosidade por alertas que possam surgir, informações relevantes, significados e sinais do cliente e também olhar com atenção para as nossas sensações, sinais do nosso corpo. Coach não suspende julgamento, mas observa com curiosidade o que este julgamento está me dizendo, de onde está vindo, o que isso tem mais a ver comigo do que com o cliente?

Será que o cliente se deu conta das sensações do Coach?

Este é o momento mágico e ético, que o coach em total presença, ao se perceber, poderá compartilhar com o cliente, suas sensações e percepções, se lembrar de sua humanidade para que o cliente também se lembre da sua humanidade!

“Conhecer a sua própria sombra é o melhor método para lidar com as sombras dos outros”

C. G.Jung

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